quinta-feira, 11 de junho de 2015

Linda

TRIM, TRIM
Ele não toca...
Mais enganos.
Não há mais toque; há tempos a gente nem se toca...
Aliás, ele não se toca mais comigo.
E assim, desse jeito, não tem toque,
Nem dele, nem meu,
E nem do telefone.

As maneiras de se dar um toque são muitas, incluindo aí as modernidades que tornam o telefone algo mais antigo. Mas, os sentimentos são os mesmos. Quem não esperou ansiosamente por uma chamada, nem sempre prometida, mas muitas vezes sim, acreditando e sonhando com os futuros momentos de encontro e/ou declarações?
Linda era uma dessas meninas que estavam sempre à espera do príncipe que ia ligar. Apesar de sua beleza, inteligência e simpatia, estava sempre só, ou melhor, acompanhada de suas expectativas. Não somente namorados ou pretendentes, mas também amigas que a excluíam de passeios e aventuras constantemente.
Colocava na aparência externa todas as cartas. Já havia até cortado sozinha seu cabelo, achando que tudo iria mudar com o novo estilo. Mas, nada. Estava sempre sozinha, sentia-se invisível, de alguma forma errada, diferente, e quando aparecia uma oportunidade, ela mesma tratava de listar um monte de exigências tão absurdas, que em alguns minutos todos se tornavam inadequados, idiotas. Para bom entendendor, somente se interessariam por ela os sem melhores alternativas. Exigente nossa menina. Mas, de certa forma, ela tinha razão, porque seu discurso era sobre merecimento, uma espécie de currículo que supostamente deveria ser apresentado, para ser avaliada a altura de qualquer candidato a namoro ou amizade, uma vez que Linda era linda. Um pouco vazia, é verdade, mas por pura ignorância. Conheci duas garotas assim, lindas e vazias. O encantamento inicial se esvaía em algumas horas, não havia nada para trocar. E quando havia, ninguém estava interessado. Que dilema, atrair pela beleza, usar os outros para aplacar a solidão, e nenhum contato verdadeiro se fazer. Cria-se um mundo de ilusões, de aparências, e de sofrimentos, mais cedo ou mais tarde. 
E assim corria a vida de Linda.Sem compreender nada sobre a situação, passava os finais de semana debruçada sobre todos os meios de comunicação da casa, aguardando os trim-trim dos que pareciam aprovados pelo seu crivo severo. Seria o novo penteado que estava horrível? Seria não se vestir como as outras meninas o motivo de não ser convidada? Precisava se tornar mais linda para ter sucesso? Ela não sabia que apenas precisava ser a Linda, que ela nem conhecia. 
Não sei que fim levou a Linda, mas com certeza, não escapou da maturidade, no mínimo fisicamente. Sim, isso já faz um bom tempo. Quem sabe ficou rica e investiu tudo em tratamentos rejuvenescedores? Talvez tenha desistido da sua lista de exigências, (pois a solidão interna é dura de engolir), e tenha se juntado a quem apareceu primeiro. Pode ser também que tenha passado pelas mãos inescupulosas dos que se divertem com a fragilidade alheia. Ou, ainda, queira Deus, aberto um canal de conexão com suas verdades interiores, e descoberto um mundo maravilhoso ao seu dispor. Tudo isso é possível e muito mais, mas a partir de hoje, ao se pegar esperando um telefonema que não chega, alcance sua bolsa, retoque o batom, e vá passear por aí. Ou simplesmente junte-se a sua alma, que costuma ser uma grande companhia, cheia de idéias criativas. Peça a ela, de coração, para dar um novo rumo àquele currículo velho e desbotado, e vá atrás dos que enxergam o que há por trás das aparências.



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